Você já parou para pensar no
futuro da sua propriedade rural? Quem irá dar andamento em seu legado familiar?
Hoje os dados do IBGE não
mentem, apenas 30% das propriedades rurais passam para a segunda geração e,
pasmem, somente 5% passam para a terceira geração, mas esse número pode crescer
se houver um plano efetivo tributário, gestão econômico-financeira e muito
diálogo.
No dicionário, a palavra
sucessão significa descendência, substituição, sequência e continuidade.
A sucessão familiar é
o processo de transferência do controle de gestão da
propriedade rural para os sucessores. Ela pode ter origem em um
acordo pré-estabelecido entre os envolvidos ou ser forçado em razão de circunstâncias
que impossibilitem a continuidade do antigo líder, como falecimento, sequelas
de acidentes e doenças graves.
O mais indicado é que a
continuidade dos trabalhos, sejam feitos pelos sucessores e não pelos
herdeiros. Tudo bem até aqui, mas qual é a diferença entre sucessores e
herdeiros?
Herdeiro é a pessoa que tem ligação sanguínea ou recebe o
patrimônio como doação em vida ou testamento, adquirindo os bens e os direitos
após a morte do fundador, ou melhor do patriarca ou matriarca da família,
seguindo uma ordem de sucessão hereditária prevista no Código Civil. Já o Sucessor tem o dever de cuidar da gestão da empresa,
por escolha antecipada e planejada de quem
faleceu, se tornando o responsável legal pelos negócios da empresa familiar
rural.
Você pode estar se
perguntando: Mas não é melhor deixar isso para quando ocorrer? Acontece que nem
todo herdeiro possui vocação para liderar uma empresa, bem como, não
é todo herdeiro que tem vontade para trabalhar no negócio familiar ou por
não ter dons, ou porque já escolheu outra profissão. Portanto, é de suma
importância o planejamento de uma sucessão familiar para que o negócio da
família continue prosperando nas próximas gerações, ainda mais no que se refere
empresa rural.
A sucessão familiar é um
tema relevante para todo o agronegócio brasileiro. Isso porque, o agronegócio
tem representado mais de 20% do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil.
Se a produção agrícola
começar a diminuir no Brasil, teremos um impacto econômico mundial muito grande,
uma vez que a expectativa do futuro, até o ano de 2030 é que o Brasil será
responsável por 65% da soja do mundo.
Por isso, é muito importante
a sucessão familiar na área rural, para que as atividades agrícolas e
a produção se manterem, e as famílias poderem contar com as próximas gerações
dentro da agricultura.
Muitos jovens não estão
sendo estimulados em permanecer no campo, em regra devido: falta de diálogo e estimulo,
distancias entre o meio rural e a cidade, desconhecimento do negócio, falta de
oportunidades principalmente para o sexo feminino, onde mesmo no ano de 2022
ainda existe muito preconceito, mas isso é tema para outra matéria.
A sucessão familiar no meio
rural implica: conhecimento, expansão e continuidade, onde muitas vezes
encontra alguns desafios como: dificuldade de o patriarca abrir espaço para os
mais novos, temor que o sucessor não valorize a propriedade, rivalidade entre
os filhos e genros/noras, despreparo técnico, diferença cultural das gerações, falta
de interesse do sucessor, visão diferenciada entre o sucessor (jovem) e o
patriarca.
Como vimos a falta de
comunicação é uma das maiores dificuldades da propriedade rural, tanto entre
aqueles que a comandam, como dos donos para os funcionários, maquiando assim a
transparência dos negócios.
Conversar e alinhar
as expectativas futuras, explicar o funcionamento da fazenda na prática e
ir incorporando o sucessor nas atividades da fazenda simplifica essa transição,
principalmente em se tratando das mulheres, onde muitas vezes são afastadas da
administração das fazendas e 87% dos casos são as sucessoras após a viuvez ou
morte prematura dos pais que irão dar continuidade na propriedade.
Dessa forma, deve haver um
clima de diálogo para tratar dos conflitos já existentes e dos que ainda podem
surgir, para evitar após o acontecimento (morte) o pagamento de impostos altos,
perdas de investimentos, vendas prematuras de propriedade, má-gestão, litígios
trabalhistas e o pior de todos a quebra do elo familiar pelas brigas entre os
herdeiros.
O planejamento sucessório
não é um processo rápido e fácil, demanda uma conversa, informações e estudo de
caso, sendo tudo pensado para diminuir custos, aumentar a rentabilidade, cuidar
das benfeitorias, dos maquinários, projetar o histórico de safras, implementar
a agricultura de precisão com o apoio da tecnologia, regularizar a documentação
e ver qual o melhor planejamento para a família como é o caso da conhecida
holding familiar.
Vejamos um exemplo prático
onde você poderá ver a diferença dos custos de uma holding e um inventário.
Vamos tomar por base um imóvel,
adquirido pelos pais há 20 anos atrás, ou seja, em 2002, pelo valor de R$
300.000,00 e declarado no seu IR por R$ 300.000,00
Nestes 20 anos, o imóvel
valorizou e passou a valer R$ 1.000.000,00. Portanto, vamos ver a diferença de
gastos com um inventário extrajudicial e uma holding, aqui nem vamos considerar
um inventário judicial (menores e desavenças familiares).
Inventário |
Holding |
|||||
Base de cálculo |
Mercado |
DIRFF |
||||
valor |
R$ 1.000,00 |
R$ 300.000,00 |
||||
Cartório de notas |
R$ 5.000,00 |
R$ 00,00 |
||||
Certidões |
R$ 1.500,00 |
|||||
Cartório de Registro de
Imóveis |
R$ 4.000,00 |
R$ 4.000,00 |
||||
ITCMD |
1% a 8% |
R$ 20.000,00 |
1% a 8% |
|||
Honorários |
5% |
R$ 50.000,00 |
5% |
R$ 15.000,00 |
||
Junta comercial |
3 atos |
R$ 1.000,00 |
||||
Contador assistente |
R$ 1.112,00 |
|||||
Sub-total |
R$ 81.500,00 |
R$ 21.112,00 |
·
Todos os valores são
aproximados, pois vai depender da alíquota aplicada e dos honorários dos
profissionais contratados.
Perceba que muitas vezes
quando uma pessoa falece, os herdeiros não têm dinheiro em espécie,
simplesmente possuem imóveis, aí que mora o grande problema, pois precisam
vender o bem para pagar as despesas sob pena de multa. Assim, sofrem com a
depreciação do bem, porcentagens de corretores, Imposto de renda com o ganho de
capital, e o resultado disso? Os filhos são rebaixados de classe social.
Portanto, a realização de um
planejamento sucessório através de uma holding vai muito além de uma estrutura
de governança familiar, economia tributária ou até mesmo proteção patrimonial.
Está diretamente ligado a
possibilitar que aquele patrimônio continue no núcleo familiar, de geração em
geração e possibilitar que os seus herdeiros possam usufruir de todos aqueles
bens que foram deixados para eles.
Você pode estar se perguntando,
mas por onde começar? Trago algumas dicas como:
·
Elaborar um DRE
(demonstrativo do resultado do exercício) ou seja, fazer uma planilha dos resultados
dos últimos anos;
·
Acompanhar o fluxo de caixa;
·
Estruturar toda parte
financeira da empresa rural;
·
Fazer um balanço gerencial
do ativo e passivo, medindo os resultados, o quanto está crescendo a
propriedade e as perspectivas para o futuro;
·
Implementar a comunicação
familiar, transparência nas ações e utilizar plataformas de governança e
gestão, trazendo a gestão de complementariedade, ou seja, todos ajudam da forma
como podem, utilizando os dons de cada integrante familiar;
·
Inserir urgentemente a
tecnologia dentro da agricultura;
·
Aprender gerenciar
funcionários, ajustar horários e serviços;
·
Buscar informações técnicas
e ensino superior;
·
Associar-se a cooperativas e
sindicatos para buscar atualidades e sustentabilidade social.
Para finalizar, mas não
esgotando o assunto, montar uma Holding não é simplesmente criar uma empresa e
colocar todo o patrimônio dentro daquela empresa como muitos falam, existe toda
uma engrenagem jurídica para possibilitar que os pais continuem com amplos e
ilimitados poderes sobre aqueles bens, garantindo assim que a sucessão
patrimonial ocorra da forma mais tranquila e menos onerosa possível, permitindo
que aqueles bens continuem com a família.
Juliane Silvestri Beltrame
Advogada especialista em
Direito das Famílias e Sucessões
Beltrame & Silvestri - Advocacia