O Brasil acaba de dar um passo histórico na consolidação do afeto como valor jurídico. Com a sanção da Lei nº 15.240/2025, o abandono afetivo passa a ser reconhecido como ilícito civil, incluído expressamente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
A nova lei impõe aos pais a obrigação de prestar assistência afetiva — não apenas material como o sustento, guarda e educação. Isso significa que o dever parental agora inclui presença, escuta, acolhimento e orientação durante o desenvolvimento da criança e do adolescente.
O texto determina que essa assistência deve ocorrer por meio de convivência ou visitação periódica, possibilitando o acompanhamento da formação psicológica, moral e social da criança ou adolescente.
O parágrafo 2 do artigo 4 do ECA, foi alterado e define três pilares da assistência afetiva:
1. Orientar nas principais escolhas e oportunidades profissionais, educacionais e culturais;
2. Demonstrar solidariedade e apoio em momentos de sofrimento ou dificuldade;
3. Estar presente fisicamente sempre que possível, quando solicitado pela criança ou adolescente.
Essas mudanças, inseridas no artigo 4º do ECA, refletem uma transformação profunda: o amor não é mais só moralmente esperado, mas juridicamente exigido.
Além disso, o artigo 5º passa a considerar o abandono afetivo uma conduta ilícita, violadora de direitos fundamentais, sujeita a reparação civil e sanções cabíveis.
Embora o tema não seja novo nos tribunais — o STJ já reconheceu indenizações por abandono afetivo em decisões paradigmáticas —, a inclusão no ECA cria uniformidade e segurança jurídica, especialmente na proteção de crianças e adolescentes em formação.
A lei não pretende obrigar o amor, mas responsabilizar a negligência emocional. A ausência afetiva, antes tratada como um problema íntimo ou moral, passa a ser reconhecida como violação de dever legal de cuidado.
Essa evolução reforça uma nova visão do Direito das Famílias: a de que ser pai ou mãe é exercer presença, não apenas prover sustento. O afeto se torna uma dimensão essencial da parentalidade, tão importante quanto a educação e o alimento.O dever de amar é, na verdade, o direito de ser amado.
A Lei nº 15.240/2025 é mais do que uma norma — é um manifesto sobre o valor da convivência e da responsabilidade emocional.
Ao reconhecer o abandono afetivo como ilícito civil, o legislador reafirma que cuidar é um ato jurídico e humano.
O amor não se impõe, mas a presença, o respeito e o acompanhamento são deveres que formam cidadãos emocionalmente saudáveis.
E agora, também, juridicamente protegidos.
Juliane Silvestri Beltrame advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, escritora e palestrante